Eu gosto de escrever. Coisas que saem do passado, um tempo onde uma carta ou um bilhete seria capaz de aproximar corações. Sou de uma época em que fazer um verso seria o prêmio especial de um final da noite; quando cantar poderia significar muito mais ao fim da serenata.

Mas muito mais, mesmo.



Volto no tempo para lembrar da minha vinda para essas bandas, a Santa Luzia que só conhecia de ir ao açougue do Frimisa uma vez ou outra. E vir morar no Conjunto Cristina, São Benedito.

O Distrito engatinhava, e por força do crescimento desordenado, muita coisa ficou por se fazer. Como consequência,hoje enfrentamos muitas dificuldades a partir do que faltou ser feito no passado.

Mas Santa Luzia cresceu! Viscejou, floresceu. É uma joia incrustada no Vetor Norte, cheia de esperança e expectativas futuras. O comércio se solidificou na região da avenida, o Centro Histórico preservado mantém suas características de tradição. Ali ainda vemos as pessoas se tratando como o “José de Antônio” – numa referência ao pai de José como se fosse um sobrenome. E as histórias ainda são contadas nas janelas dos casarões, por gente que viu a cidade caminhar para um patamar nunca imaginado em poucas décadas. Deixou de ser vilarejo, explodiu como quase metrópole. 

Santa Luzia de tradições que não se apagam. Da Matriz, do Taquaraçu que só conheci depois de muitos anos morando por aqui. Da flamejante Av. Brasília até o burburinho domingueiro da Praça da Savassi no Palmital. Orgulho de tantos, amores de outros muitos. Santa Luzia que abre seus portais e recebe visitantes de todas as direções. Que se tornou referência no comércio pela qualidade daqueles que aqui investiram quando ninguém acreditava. Das indústrias de peso, de bairros inteiros criados para abrigar seus trabalhadores.

Uma cidade capaz de receber pessoas tiradas de suas casas, como nas enchentes à época da ocupação do Cristina e do Palmital. Na verdade , o Conjunto Habitacional Maria Antonieta Mello Azevedo. Reza a lenda (ou seria a história?) que teria sido ela a doadora das terras para construção de casas a famílias carentes. E hoje vemos os luzienses recebendo novos moradores, agora ocupantes das torres de apartamentos e dezenas de conjuntos de prédios, principalmente na região das Chácaras. Uma mudança que, nos últimos anos, transformou o perfil do morador daqui, mas sem conseguir transmutar a essência de quem já se tornou um verdadeiro Luzia.


A cidade ampla, espalhada e misturada a uma diversidade ambiental consistente, abriga mais de 82 bairros. Não há coerência se pesquisarmos sobre isso. Mas o mínimo seria esse número.

O fato é que de Taquaraçu ao São Cosme, de Pinhões ao Bom Destino, eis que nos vemos numa cidade pulsante, cheia de sonoridade, cultura e desenvolvimento. Uma cidade que merece nosso afeto, pois nosso encontro com suas tradições e vielas não podem ser esquecidos. Essas histórias estão no coração de quem as viveu, e cada rua tem um pedaço delas para servir de referencia ao futuro. Santa Luzia de todos nós. Onde os sonhos se encontram. E que faz de toda sua trajetória um verdadeiro caminho entremeado de heroísmo e persistência. Do Muro de Pedra que contempla o vale onde uma guerra foi travada. Da Pedra Bonita recebendo pessoas em busca de um recanto para esporte e lazer. Da Matriz no alto da Rua Direita, dominando o cenário e a nossa fé. Da Pracinha da Savassi que se agiganta e se alarga para receber milhares de visitantes. Santa Luzia para todos nós. Uma cidade verdadeiramente para se amar. Me dá conforto sentar à frente de um computador e deixar que os dedos definam aquilo que eu tenho como sentimento. Invento, reinvento, reproduzo as sensações mais bobas que me passam pela cabeça. Escrevo o que penso, e dificilmente reviso o que escrevo. E talvez por isso, tanta coisa fica guardada, quase que por medo de demonstrar tanta besteira. É no teclado que deixo minhas ideias,  sonhos, conspirações e pressentimentos. É na palavra escrita que encontro o desapego necessário para olhar para tudo sem muita mágoa. Viver sem me contradizer. Escrever para mim é algo muito próximo de uma libertação da alma. A tal ponto que ao fazer algumas compilações publiquei dois livros - pequenos é verdade, mas são livros! - a partir de pinceladas sobre assuntos diversos. "Em Teu Nome" é o cumprimento de uma promessa na Quaresma. "Pra Dormir Pensando", bem, este é um resumo das minhas "variadas" todo dia pela rede social. Falo o que penso e vou pra cama. Quase sempre. Na verdade, dormir pensando é um chamado à reflexão de nossas coisas diárias. São minhas e acabam se tornando de muita gente. Tem gente que me questiona: “como dormir e pensar ao mesmo tempo?” E é nessa grande viagem que faço do pensar o tema de meus sonhos, onde comumente me encontro. Apenas sigo pensando, em sonho, enquanto durmo tranquilamente.

Sou um escriba do nada. São tantas as coisas que escrevo que acabam não tendo uma sequencia. Não escrevo um livro com enredo, nem um aglomerado de contos. Não sou um cara que vivo daquilo que publico. Mas estou ai, fazendo das letras, das palavras portuguesas um exercício sem fim de amor imenso. Despejo na palavra todos os meus  sentimentos. Só constato que são nelas que eu estou, sempre firme e verdadeiro,  isso é fato. As palavras, essas amigas de toda hora que badalam como sinos me alertando da existência de coisas que às vezes

esqueço. Coisas que deveriam estar presentes, não em mim, mas nas atitudes que tenho. Falo de mim, dos meus filhos, da minha família e de tudo que acredito. Escrevo sobre o amor, falo do abandono, grito contra a injustiça! Escrevo ligeiro, encho as linhas com uma profusão de frases, cada palavra digitada parece mais um respiro de alívio. Sinto-me livre, como se escrever pudesse fixar na tela o meu verdadeiro ego, aquele capaz de mudar o mundo! Coerente, correto. Livre, e, o melhor, com asas que me levam a um universo perfeito.

Fico me lembrando de fatos passados. E eles se transformam em motivo para escrever ainda mais. Um jovem que usava rascunhos de papel para datilografar poesias, textos, nas folgas de trabalho na Cemig. E, incansável, batia o ponto e voltava para o instrumento de trabalho para – agora sim! – fazer da boa Remington 100 uma verdadeira bateria de prazer. Pois é, sou do tempo em que datilografia era profissão. E do tempo em que estudar numa universidade era para poucos. Por isso a mistura entre dedicação e tenacidade. Sair do Anel Rodoviário, direto  do serviço para a faculdade era necessário. E na PUC, dentro de sala ou mesmo no DCE a história se repetia: tome escrever com garranchos que só eu entendia. No dia seguinte, eles eram copiados para os rascunhos datilografados. Hoje, guardados que estão nem sei onde, essas  lembranças poderiam ser algo digno de revisão. Um registro da saga de um arremedo de escritor. Um dicionário de falar de tudo e nada ao mesmo tempo. Isso porque faço dos dedos minha caneta, da minha memória, meu pincel. Misturo tudo de um jeito bem próprio, para muita gente isso seria esquisito. Mas é assim que consigo mudar a chave, virar a página e seguir em frente. O melhor de mim sempre vai estar no meio do que escrevo. Guardo na palavra o meu segredo. E dos meus segredos, tento fazer poesia. Escriba do nada que sou, faço do ato de escrever a maior conquista de liberdade possível. Pois que se não sou dono do meu Destino, assumo os riscos de escrever sobre ele. Ser escriba, não escritor. Viver pelas palavras, não delas.


(Essa Crônica foi enviada para análise da Comissão Julgadora de bolsas da Lei Aldir Blanc.)

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